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As II Jornadas da Comissão de Proteção de Crianças e Jovens (CPCJ) da Sertã decorreram ontem na Casa da Cultura da Sertã, sob o tema "Do Silêncio à Ação: Relações que marcam", apresentando painéis tão inquietantes como emergentes: da violência no namoro à violência sexual, passando por uma agenda infantil cada vez mais sobrecarregada e a problemática de uma adultização cada vez mais precoce. Na sessão de abertura, Carlos Miranda, Presidente da Câmara Municipal da Sertã, realçou a pertinência dos temas que ali iriam ser abordados, dando destaque aos painéis realizados da parte da manhã. |
"Estamos a viver tempos de alguma regressão. Valores que considerávamos devidamente assumidos, parece que neste momento são de alguma forma postos em causa" notou o edil, acrescentando que, às vezes, basta atentar na música que os jovens ouvem: "se antes procurava liberdade e emancipação, hoje apresenta-se com um conteúdo cada vez mais indigente, sendo muitas vezes machista e misógino", concluiu.
Voltando ao silêncio, e como fez notar Maria João Fernandes, Vice Presidente da Comissão Nacional de Promoção dos Direitos e Proteção das Crianças e Jovens (CNPDPCJ), este assume um duplo sentido: se por um lado é protetor, por outro, e na maioria das vezes, alimenta ciclos de violência, tornando-se o braço direito do agressor.
Estes foram, aliás, os temas centrais dos painéis da parte da manhã - a violência e o silêncio. Elizabete Brasil (CICS.NOVA) começou por apresentar o tema "Violência no namoro: entre o afeto e a agressão. Como reconhecer a violência no namoro?", traçando um retrato desta realidade na sociedade portuguesa, apresentando dados impactantes (87,5% das vítimas foram mulheres), assim como as características que permitem identificar uma relação abusiva e como se libertar dela.
Seguiu-se Joana Alexandre (ISCTE) e Maria João Fernandes (CNPDPCJ) que abordaram o tema "Abusos sexuais: da prevenção à ação: O papel das CPCJ na Violência Sexual", chamando à atenção para a frase "não fales com estranhos" quando, na verdade e na maioria dos casos, o abuso sexual acontece em casa, com conhecidos ou familiares.
Já na parte da tarde, Natália Fernandes (Universidade do Minho) começou por apresentar o "Direito a brincar: crianças sobrecarregadas, infâncias apressadas" onde abordou a importância do ato de brincar, que hoje é cada vez mais limitado e controlado, o que acaba por trazer implicações ao desenvolvimento das crianças. Chamou também à atenção para muitos vídeos em redes sociais onde crianças são protagonistas, falando de temas que não são infantis, como dietas ou maquilhagens. Esta chamada de atenção abriu portas para o último painel do dia "Adultos antes da hora: os impactos da adultização precoce", que se materializou através da apresentação do vídeo "Adultification" do youtuber Felipe Pereira. Mais conhecido como Felca, este influencer expõe neste vídeo casos reais de crianças que viram a sua infância interrompida por se tornarem "estrelas" das redes sociais, e que, ainda menores, acabaram por ser vítimas de exploração e sexualização para criação de conteúdos para adultos.
No final do dia, ficou clara a necessidade urgente de intervenção, consciencialização e sensibilização, junto de crianças e jovens (assim como pais e encarregados de educação) em matérias de violência, adultização e acesso a conteúdos que não são apropriados. Além de prejudicarem nefastamente o desenvolvimento, deixam marcas nas vidas futuras das vítimas, como destacou a atual presidente da CPCJ Sertã, Maria João Ribeiro. Através de relações (sejam elas quais forem) "as crianças podem aprender a confiar e a criar laços... mas também podem aprender o significado de medo, insegurança e violência", finalizou.
A iniciativa foi pautada por momentos musicais: a abertura das Jornadas foi assinalada pela atuação do Grupo Folclórico da APPACDM da Zona do Pinhal, e o seu encerramento ficou a cargo do Polo Artístico da Sertã do Conservatório de Música de Coimbra. Dinamizadas pela CPCJ Sertã, estas segundas jornadas contaram com o apoio do Município da Sertã.